Arquitetura da crise
Este projeto é o resultado de um processo complexo de transformação da cidade durante um determinado contexto econômico. Localizado no antigo local das fábricas Renault em Boulogne-Billancourt, o projeto faz parte do Trapèze Ouest, um dos setores de operação da Île Seguin-Rives de Seine, entre os mais importantes centros emergentes na Île-de-France.
A área consiste em uma nova região como usos mistos, residencial e dinâmica, na vanguarda do desenvolvimento sustentável. Cada quadra do Trapèze é objeto de uma combinação arquitetônica de alto padrão. A harmonia entre mercado aberto e habitação social, escritórios, espaços verdes, espaços comerciais e equipamentos públicos, juntamente com a ambiciosa vocação cultural da Île Seguin, são elementos que contribuem para a criação de uma área de vivência excepcional no lado oeste de Paris.
Neste território, os interesses públicos e privados são evidentemente obrigados a se cruzarem. A segregação das disciplinas onipresentes no sistema francês é antagonista a esta abordagem, manifesto da clara separação entre as práticas de planejamento e desenho urbano, arquitetura, paisagismo e gerenciamento de obras. Certamente, a colaboração existe, mas o grande número e a diversidade dos participantes causam uma raridade normalizada nos pontos de intersecção entre as diferentes visões. Um programa e volumes rigorosamente definidos, baixos custos de construção, a eminência de uma crise econômica, um sistema de mercado imobiliário privado que isola o planejador urbano do local, normas de certificação restritas… isto, abruptamente, representa uma realidade que toda ideia, visão ou arquitetura um dia irá enfrentar.
Imaginar um objeto de resistência
O primeiro passo de nosso trabalho consiste em desenhar neste contexto hostil um questionamento pertinente: “em uma rede de trabalho onde a capacidade do arquiteto é sabidamente limitada e em um contexto onde as condições econômicas são incertas, como imaginar uma arquitetura capaz de resistir às mudanças perturbadoras? De enfrentar situações de crises? Uma arquitetura que possa se justificar nela mesma e em qualquer momento? O que então seria os valores fundamentais em que se basearia nossa intervenção?”
Em momentos difíceis, deve-se retornar aos fundamentos e às escolhas que são as mais reduzidas: é simplesmente o instinto de sobrevivência. Com este projeto, decidimos enfrentar o cenário mais desafiador desde o primeiro esboço. Nesta operação, deixamos de lado estudos exaustivos em urbanidade e potenciais para nos agarrarmos – métodos anterior e custosamente explorados no escritório – à volta do postulado essencial: um espaço existe apenas se é construído.
Simplificação, subtração e valores atemporais desenharam as três linhas guias a 70° a Sul, as quais o nome foi escolhido pela equipe de marketing do cliente.
Simplificação: de um ponto de vista técnico, uma forma de reduzir custos. Um único detalhe conduz o todo do projeto: janela-corredor-corrimão. Com esta montagem, podemos também incluir proteções solares e aberturas.
Subtração: a estrutura se torna fachada, concreto aparente, sem elementos supérfluos, sem ornamentos gratuitos.
Valores atemporais: para atrair pessoas, a estratégia posta em prática é encontrada nas qualidades incontestáveis do edifício: iluminação, orientação, vistas e organização.
Se é permitido que cada indivíduo interfira em sua moradia de acordo com seu gosto e necessidades, os fundamentos que contribuem para as qualidades deste edifício são imutavelmente asseguradas.
O projeto sugere uma forma construída que é simples e legível. As fachadas sul e leste são pontuadas por diversas aberturas amplas, estendendo o interior das moradias para os corredores externos que correm ao longo do edifício. Grandes varandas são inseridas em intervalos nas linhas dos terraços, projetando-se para fora. A justaposição de elementos salientes, pontuais e lineares proporciona a impressão de um edifício mais leve e fino para as ruas Yves Kermen e Emile Zola. A construção se preenche como um todo como um elemento de canto, proporcionando uma distinção clara dos edifícios do entorno.
Jogos de cheios e vazios, horizontais e verticais, luz e sombra, vidro e cortinas causam na fachada tanto sobriedade como animação. Para a simplicidade do desenho foi inserida a riqueza do material. Procurávamos um acabamento que fosse limpo, puro e refinado, mas rico o suficiente para refletir a luz e comunicar-se com as cores de seu entorno.
- Cliente: Nacarat
- Custo: 7,2 milhões de euros